quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Algum lugar que só nós conhecemos


E ele caminhava sem rumo, pisando sobre uma terra vazia, porém conhecia aquele caminho como a palma de sua mão. Queria apenas sentir a terra sob seus pés.
Dirigia seu olhar para os céus e tentava gritar para o mundo ouvir o quanto ele era simples: sou simples! Apenas isso, sou simples.
O suor escorria sobre sua testa e quando sentia a fadiga em seus tornozelos avistou um rio, a tensão ao vislumbrar aquela quantidade de água fazia sua feição vibrar de alegria. Aproximou-se devagar e sentou na beira das águas límpidas, pôs seus pés cansados naquela água e sentiu o rio completar sua existência.
Ao deitar sobre o dorso do rio contemplou seu reflexo assim como Narciso fizera, mas diferente dele não apaixonou-se pelo que via, encarou as águas claras e perguntou: 

- Ó coisa simples, para onde você foi? Estou ficando velho e preciso de algo para confiar.

Instantaneamente foi arremessado ao passado de seus antepassados velhos, errantes e sábios. Lembrou dos julgamentos que sofreram, dos dedos apontados das quais foram submetidos, quanta hipocrisia naquele mundo ainda existia. A testa franziu, um sentimento de pequena dor quis tomar conta de seu coração no mesmo instante em que um singelo sorriso lhe surgiu no canto da boca. Havia lembrado do quanto aproveitará os últimos momentos em que passou ao lado deles, naquela época guardou seus questionamentos frívolos em uma bagagem bem distante que ficou nas encruzilhadas do destino e apenas sentiu com simplicidade o quanto havia aproveitado a estada daqueles seres tão estranhamente perfeitos que foram colocados em sua vida. Fazia questão de deixar as tensões, tristezas e tempestuosidades de lado para aproveitar o riso fácil, a refeição saborosa e o colo fraterno que tinha, pois sabia que logo aqueles abraços se perderiam nos confins das lembranças envolvidas pela saudade. Não queria jamais sentir remorso do que não fizera por um ser vivo que respirava e lhe solicitava afeto ao seu lado.
Saindo de sua lembrança olhou novamente para o rio e perguntou:

- Quando você simplicidade vai me deixar entrar? Estou ficando cansado e preciso de um lugar para começar.

Foi quando de imediato o rio formou uma imagem em suas ondas calmas e serenas que lhe mostravam a felicidade que já estava ao seu lado. Ela era figurada com um sorriso largo e branco, olhos brilhantes e amendoados, um perfume jamais sentido antes, acolhimento genuíno, ao invés do peso de uma mão que machuca a leveza de uma mão que acarinha e o som de uma gargalhada farta de alegrias, com um coração muito brilhoso.
Com apenas um sinal afirmativo mostrou que já havia percebido a felicidade que lhe era apresentada. Tinha apenas dúvidas de como seria a melhor maneira de demonstrar o quanto tudo aquilo lhe fazia bem. Recordava-se que tentava de todas as formas, com mensagens, palavras e versos, abraços e beijos, carinhos silenciosos, proteção e zelo, sorriso fácil verdadeiro e companheirismo. Talvez faltava-lhe aprender a ser ainda mais simples, esse talvez seria o seu maior desafio.
Entristeceu, pois sabia de sua síndrome do polvo adquirida ao longo da caminhada, queria poder abraçar a todos com seus tentáculos revestidos de ternura, embora sabia que as vezes algumas prioridades devem ser tomadas. 
Caminhou mais um pouco e avistou uma linda árvore caída como que se pedisse sua ajuda. Aproximou-se rápido, seu senso de hospitalidade falara mais alto. De prontidão seus galhos se voltaram para ele como que lhe deixando espaço para um questionamento. Meio tímido ele perguntou:

- Esse é o lugar com o que tenho sonhado? Esse é o lugar que eu costumava amar?

A árvore virou-se em sentido ao seu coração e disse:

- Esse é o seu lugar, o lugar em que sempre buscou sabedoria e acolhimento, ele está assim triste, porque caminha conforme o seu coração. De qualquer forma estamos felizes por ter aparecido e tentado buscar respostas, a simplicidade é o seu caminho, o manto da humildade e solidariedade são a sua vestes, não tema o mundo lá fora, leve estas atitudes ao maior número de pessoas possíveis e faça sua presença valer a pena em qualquer lugar que pisares, agindo desta forma tudo aqui ficará bem outra vez. Não tema os desafios, supere os obstáculos. Este é um lugar que só nós conhecemos e ficará sempre aqui pra você abastecer o combustível do seu coração. E jamais, jamais espere o sol se pôr para abraçar alguém e dizer o quanto a ama.

Foi quando ele abriu os olhos num suspiro profundo, era de manhã e os raios sol cortavam sua persiana entre aberta, sentiu a brisa da manhã levantou-se e seguiu seu dia com o coração aquecido por um sonho quase real. Ao lado de sua cama, repousava em sua mesa de cabeceira um pequeno ramo de árvore e fotos das pessoas que ele tanto amava.

por Charle Oliveira